I
Nem aqui nem ali: em parte alguma. Não é este ou aquele o meu lugar. Desço à praia, mergulho as mãos no mar, mas do mar, nos meus dedos, fica a espuma.
Meu jardim, minha cerca, meu pomar. Perpassa a Ideia e mói, como verruma. Falar mas para quê? Só por falar? Já nada quer dizer coisa nenhuma.
Os instintos à solta, como feras, e eu a pensar em velhas primaveras, no antigo sortilégio das palavras.
Agora é tudo igual, prazer e dor, e a tua sementeira não dá flor, ó triste solidão que as almas lavras.
II
Tão só! Cada vez são mais longos os caminhos que me levam à gente. (E os pensamentos fechados em gaiolas, as ideias em jaulas.)
Ah, não fujam de mim! Não mordo, não arranho. Direi: — «Pois não! Ora essa! Tem razão».
Entanto, na gaiola, cantarão em silêncio os sonhos, as ideias, como pássaros mudos.
III
Solidão. A multidão em volta e o pensamento à solta como alado corcel. E as ideias dispersas, em tropel, como folhas ao vento pétalas do Pensamento.
Solidão. A angústia da Cidade, a impossível procura da Unidade, o clamor do silêncio interior, mais pungente, estridente, que os bárbaros ruídos que ferem, dilaceram os nervos e os sentidos.
Autor: Fernanda de Castro Editado por: nicoladavid |