Não vejas, Nise amada,
A tua gentileza
No cristal dessa fonte. Ela te engana,
Pois retrata o suave,
E encobre o rigoroso. Os olhos belos
Volta, volta a meu peito:
Verás, tirana, em mil pedaços feito
Gemer um coração: verás uma alma
Ansiosa suspirar: verás um rosto
Cheio de penas, cheio de desgosto.
Observa bem, contempla
Toda a mísera estampa. Retratada
Em uma cópia viva
Verás distinta e pura,
Nise cruel, a tua formosura.
Não te engane, ó bela Nise,
O cristal da fonte amena;
Que essa fonte é mui serena,
E mui brando esse cristal.
Se assim como vês teu rosto,
Viras, Nise, os seus efeitos,
Pode ser que em nossos peitos
O tormento fosse igual.
Autor: Cláudio Manuel da Costa (1729-1789)
Editado por: nicoladavid