
A educação actual e as actuais conveniências sociais premeiam o
cidadão e imolam o homem. Nas condições modernas, os seres humanos vêm a ser
identificados com as suas capacidades socialmente valiosas. A existência do
resto da personalidade ou é ignorada ou, se admitida, é admitida somente para
ser deplorada, reprimida ou, se a repressão falhar, sub-repticiamente
rebuscada.
Sobre todas as tendências humanas que não conduzem à boa cidadania, a
moralidade e a tradição social pronunciam uma sentença de banimento. Três
quartas partes do Homem são proscritas. O proscrito vive revoltado e comete
vinganças estranhas. Quando os homens são criados para serem cidadãos e nada
mais, tornam-se, primeiro, em homens imperfeitos e depois em homens
indesejáveis.
A insistência nas qualidades socialmente valiosas da
personalidade, com exclusão de todas as outras, derrota finalmente os seus
próprios fins. O actual desassossego, descontentamento e incerteza de
propósitos testemunham a veracidade disto. Tentámos fazer homens bons cidadãos
de estados industriais altamente organizados: só conseguimos produzir uma
colheita de especialistas, cujo descontentamento em não serem autorizados a ser
homens completos faz deles cidadãos extremamente maus.
Há toda a razão para supor que o mundo se tornará ainda mais completamente
tecnicizado, ainda mais complicadamente arregimentado do que é presentemente;
que graus cada vez mais elevados de especialização serão requeridos dos homens
e mulheres individuais. O problema de reconciliar as reivindicações do homem e
do cidadão tornar-se-á cada vez mais agudo.
A solução desse problema será uma das principais tarefas da educação futura. Se
irá ter êxito, e até mesmo se o êxito é possível, somente o evento poderá
decidir.
Autor: Aldous Huxley (1894-1963)
Editado por: nicoladavid
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